06: Exílio

ESCRITO POR DANIEL MANNING
PRODUZIDO POR MISCHA STANTON
TRADUZIDO POR JÚLIA OLIVEIRA
[EN]

[gravador de fita liga; dentro de um caminhão]

BILL DONOVAN (BD): Chet, quanto tempo falta?

CHET WHICKMAN (CW): Aproximadamente 45 minutos.

JACK WYATT (JW): Então, por favor, podem nos dizer para onde, em nome de Deus, estamos indo?

SALLY GRISSOM (SG):  Ainda não cortei “prisão militar” e “matadouro” da lista.

CW: Para ser completamente sincero com você, Doutora Grissom, se fôssemos desaparecer com vocês, não teríamos dirigido metade do caminho até o Canadá para fazê-lo. O deserto já é bem vazio.

ESTHER ROBERTS (ER): Bom saber quão poucos escrúpulos vocês têm sobre nos matar...

BD: Por que levaríamos vocês a uma prisão?

ER: Porque... porque fizemos a cidade ser fechada. Foram nossa culpa todo o dinheiro e recursos desperdiçados. E agora somos traidores.

SG: Somos pontas soltas.

JW: Ou ambos.

BD: Relaxe, todo mundo. Estamos levando vocês à cidade de Ponto de Exílio, Colorado.

ANTHONY PARTRIDGE (AP): Fale sério, Bill, isso soa inventado.

BD: Chet?

CW: Hm... Fundada em 1917, altitude de 7742 pés. É a 84ª cidade mais alta dos Estados Unidos continentais.

ER: É como ter uma enciclopédia.

CW: Não sei o que quer de mim. Puseram isso em um panfleto.

BD: Vocês quatro foram tudo o que restou da Agência de Desenvolvimento de Recursos Anômalos. Vocês, Chet e eu.

SG: E os quatro jeeps cheio da máquina do tempo atrás de nós.

CW: E a Sra. Partridge.

HP: Na maior parte do tempo, sou só uma acompanhante...

BD: Queria que vocês quatro soubessem: acredito no trabalho que estão realizando. Não há nem palavras para o quanto acredito no que estão fazendo. Mas foi decidido que os Estados Unidos precisam de um serviço de inteligência coordenado. Não essa farsa fragmentada que estivemos mantendo até agora.

ER: O que isso tem a ver conosco?

SG: Ha. Haha. Ahahaha. Haaahahahaha. Não.

ER: O quê?

SG: Donovan acha que a Timepiece vai dar a ele uma vantagem na corrida pra virar o próximo melhor setor de inteligência dos Estados Unidos. Mas está errado. A Timepiece mal funciona, e sozinha não é nem perto de tão útil quanto ele acha.

BD: Você está certa, não é. É por isso que não está trabalhando para a Central de Inteligência. 

SG: Então o que estamos fazendo aqui?

BD: Se eu prometer ser breve, param de me interromper?

SG: Vou dar meu máximo, mas você ‘tá pedindo muito.

BD: Vocês não trabalharão para uma agência. Trabalharão diretamente para mim.

HP: Então não estão nem sequer trabalhando para o governo?

CW: É isso que vai dizer no talão de pagamento. Mas não vai ser exatamente verdade.

BD: Ponto de Exílio foi designada como posto avançado da Central de Inteligência, mas o projeto de vocês não será oficialmente uma parte dele. Oficialmente, vocês estavam sem rumo. [cof] Seus contratos com os Serviços Estratégicos acabaram, a ADRA não existia mais. [cof]

JW: Isso não parece exatamente legítimo...

SG: Você ‘tá bem, colega?

BD: Ficarei bem. Consegui garantir a vocês o mesmo acesso a recursos que tinham em Polvo. E funcionarão no mesmo sistema, pelo menos pelo primeiro ano ou por volta disso. O quanto demorar para o governo passar pela burocracia. Vai tudo se encaixar à sua volta, e ninguém soube que não é para estarem lá para começo de conversa.

ER: Acha mesmo que vale tudo isso?

BD: Acho que você não entende. O trabalho que estão fazendo, a máquina que inventaram... foi a maior conquista da humanidade desde a lâmpada. Desde a prensa. Desde a pólvora e o ferro e a roda. Desde que o homem descobriu o fogo. O que estão fazendo tem potencial ilimitado para mudar o mundo. Eu verei... eu vi isso, claro como o dia. E não me perdoaria se deixasse vocês desistirem por causa de alguns pequenos contratempos.

JW: Pequenos contratempos?! Um homem morreu!

BD: Desculpe-me. Eu me expressei mal. Os contratempos foram substanciais. Mas onde o mundo estaria se Thomas Edison tivesse desistido toda vez que falhou?

AP: Bill, esse foi um ótimo discurso, mas e eu? O que estou fazendo aqui?

BD: O Projeto de Mecânicas de Previsão está sendo integrado à pesquisa da Timepiece. Anthony, você será parte da equipe de Sally.

HP: Mas Anthony era seu diretor de desenvolvimento de projetos!

BD: E agora não é mais.

HP: E você só vai jogar tudo aquilo fora?

AP: Obrigado, Helen, sério, mas não preciso de você se metendo assim...

HP: Me metendo?! Como pode deixá-lo fazer isso?

AP: Discutimos isso depois.

SG: Mas, Donovan, por que está fazendo isso? O que você ganha sustentando a Timepiece, e em segredo? Nós te damos “a maior conquista desde a lâmpada” pra usar como quiser, pra que você possa usar viagem no tempo pra espionagem e zombar do devido processo legal? Não, não vou participar disso.

BD: Escuta, sei o que devem achar de mim. Um homem grande com uma pasta cheia de segredos e planos escondidos. Mas a verdade é que quando Polvo foi fechada, perdi mais que qualquer um de vocês. Banido para uma pequena cidade montanhesca, despojado de tudo que possuía. [cof] Estou usando os últimos favores que deviam para mim para convencê-los a me deixarem continuar, e me fornecerem recursos o bastante para manter o projeto. Por quê? Porque vou acreditar que o trabalho que estão realizando ia... vai mudar o mundo para melhor. Acredito que o mundo precisa de nós. E acho que se não acreditassem em mim, não teriam me seguido até aqui.

[rádio sintonizando]                                   

SG: Diário de Sally Grissom, 23 de fevereiro de 1946. Então, estou aqui há algumas semanas... que tipo de nome é Ponto de Exílio, aliás? Estou lendo nas entrelinhas aqui, mas o panfleto de boas-vindas da cidade implica que um punhado de mineiros ficou revoltado com uma disputa trabalhista qualquer, decidiu bêbado abandonar o buraco na terra que estava ocupando e, quando ficou sóbrio, abriu a loja no meio da floresta. Era o exílio deles. O lugar de exí- Ponto. Ponto de Exílio. Estava tentando dizer ponto de exílio. Porque, você sabe, é o nome... quer saber? Deixa pra lá. Não sei por que estou explicando isso pro meu diário.

Talvez o ar daqui esteja me afetando. É bem mais rarefeito que no Novo México, denso como era com toda a poeira do deserto. Aqui em cima é mais limpo. Me sinto... sei lá. Revigorada. É claro, isso pode ser eu só começando a sentir a hipóxia generalizada. Veremos. 

Acho que sou a única pessoa do nosso anteriormente feliz grupo de cientistas que está realmente gostando do novo lugar. Partridge não está apreciando o que é essencialmente um rebaixamento e, depois do que houve no Natal, Wyatt não parece mais tão envolvido. Eu não saberia dizer, minha cabeça ainda está meio confusa sobre tudo que aconteceu. Acho que um encontro com o Grande Nada faz superciência secreta do governo parecer sem graça. Roberts tem trabalhado três vezes mais só pra cobrir as lacunas que eles deixam. Pobre garota. Precisa desesperadamente de uma folga, mas não acho que tenho uma pra dar pra ela.

[rádio sintonizando; Esther e Jack jogando cartas]

ER: Não acho que funcione assim.

JW: É, mas você está sugerindo que só façamos tudo o que o Diretor mandar.

ER: Estou dizendo que isso é o melhor para o projeto.

JW: Quando o que é melhor para o projeto interfere no que é melhor para nós?

ER: Nós quatro somos as únicas pessoas no mundo que sabem o bastante para manter a Timepiece funcionando. Não podemos simplesmente abandoná-la justo quando está ganhando uma segunda chance.

JW: Ou só podemos deixá-la hibernando. Podemos conseguir empregos de verdade, que pagam dinheiro! Mesmo se algum de nós falhar no setor privado, qualquer universidade beirando a decente ficaria mais do que feliz em nos contratar.  

ER: Não há nenhum outro lugar como este. Esta é uma oportunidade única. Estamos desenvolvendo uma matéria de física completamente nova. Que tipo de pagamento vale isso?

JW: Bom, considerando que não podemos nem sequer falar sobre nossa nova matéria de física e que todo crédito provavelmente irá para a Dra. Grissom ou, pior, Bill Donovan.

ER: É com isso que você se importa? Crédito?

JW: Com o nosso salário, pode apostar que sim.

ER: Você está agindo como uma criança.

JW: Você não estava lá. Não teve sua cabeça esmagada por um lunático exausto, mal pago e superestressado que estava carregando um cano.

ER: Tem razão, eu não estava lá. Mas estou aqui agora. E vou ficar, vou continuar fazendo o meu trabalho. Se quer desistir, é direito seu. Mas isso significa que vai sobrar tudo para mim. E isso significa que não tenho tempo para sentir peninha de você.

[Esther joga as cartas, levanta da mesa]

ER: Acabamos aqui.

[Esther sai, esbarrando no gravador de fita; rádio sintonizando]

SG: Diferente deles, estou acostumada a ser uma forasteira. Na verdade, está bem melhor dessa vez. As pessoas de Ponto de Exílio são simpáticas e hospitaleiras. Parece que Sally Grissom é uma jogadora de conversa fora decente, quando não está roubando empregos porque foi de hoverboard até 1943. Tudo está mudando nos EUA. As pessoas estão otimistas sobre o que vem a seguir. O entusiasmo pós-guerra aqui é palpável. Todo mundo está igual àquele marinheiro no Dia da Vitória, só que... menos nojento. Pras pessoas de P de E, sou só a agradável garota nova na cidade que faz algo vago com rochas e mapas na pequena base do Departamento do Interior. É claro, na verdade trabalho pro Departamento de Tecnicamente Nem Sequer EUA, desenvolvendo sistemas de coleta de informação incrivelmente complicados, mas alguém realmente sabe o que seus vizinhos fazem no trabalho?

[rádio sintonizando]

HP: Você me disse que isso era uma transferência, uma promoção! E agora descubro não só que não está trabalhando mais para o Exército, mas que é mais uma das abelhas operárias de Sally? Está falando sério?

AP: Helen, você ouviu o Diretor. Ele arriscou o próprio pescoço para nos trazer para cá. Não teria o feito se não precisasse da minha perícia no assunto. Precisam de mim aqui.

HP: Eu preciso de você aqui! Saímos de Massacchusetts por você. Pus tudo em espera por você. Você me contou sobre seu projeto secreto, que tinha que ir ajudar a acabar com a guerra. E o fez! Mas agora lutamos a última guerra e é hora de os soldados voltarem para casa.

AP: Não estou lutando, Helen. Não estou lutando guerras. Estou tentando acabar com elas. Antes mesmo de começarem. 

HP: Acredita mesmo que vai acabar com todas as guerras? Acha que é mais inteligente que todos os grandes e terríveis homens que disseram exatamente isso ao longo da história?

AP: Eu tenho mais capacidade de fazê-lo que qualquer um desses homens teve!

HP: Tem mesmo? Ou só está caindo na mesma armadilha que caíram? César, Alexandre, Napoleão. O imperador e o Kaiser e o Fuhrer. Todos acharam que trariam paz ao mundo. E lutaram e lutaram e, no fim das contas, milhares morreram e as pessoas continuam lutando. Acha mesmo que é tão diferente, só porque tem ferramentas melhores? Eu vi a bomba, Anthony. E foi só a primeira. Agora o mundo a viu também. E acha que vão fugir com o rabo entre as pernas? Não. Agora tudo mudou, e todos querem uma para si.

AP: Escuta, Helen... Eu amo você.

HP: Também amo você.

AP: E preciso fazer isso. E preciso de você aqui comigo.

HP: Fico preocupada com você, Anthony. O tempo todo. Toda essa pressão que coloca sobre si mesmo. O que sequer estamos fazendo aqui, no meio do nada, fazendo Deus sabe o que, comigo sentada à toa o dia inteiro desejando que, uma vez na vida, fôssemos só um casal normal vivendo vidas normais em uma cidade normal?

AP: Esta é uma cidade normal! Um pouco remota, mas... Olha, não é mais como era antes. Não precisa ficar tomando cuidado com cada palavra que diz, perguntando-se se falou demais. Bom- ainda não pode contar o que eu faço a ninguém, mas foi sempre assim. Podemos ser pessoas de verdade aqui, Helen. Podemos ter uma vida. As coisas no Novo México não eram perfeitas, mas podemos tentar de novo aqui. Quero fazer isso com você, Helen. É a única mulher que já amei. 

HP: Nosso segredinho...

AP: Nosso segredinho.

HP: Qual é seu disfarce desta vez?

AP: Departamento do Interior. Se alguém perguntar, diga que tem a ver com radares e previsão do tempo.

HP: Acha mesmo que podemos fazer isso funcionar? Olhe nos meus olhos e diga a verdade.

AP: Não posso prever o futuro, mas acho que sim. Sei que sim. Somos fortes.

HP: Seu trabalho não era para ser prever o futuro?

AP: OK, você tem um ponto. Posso prever o futuro. E prevejo que vamos nos sair muito bem.

HP: O jantar está esfriando.

AP: Suponho que sim.

[rádio sintonizando]

SG: Tem quase três anos que estou nos anos quarenta, e já superei a maior parte das diferenças culturais. Consigo acompanhar o jazz animado deles e, apesar da minha imitação do Borat não funcionar muito bem aqui, nunca funcionou de verdade em 20█ também, então talvez só não fosse pra ser. Troquei a Internet pelo rádio e-[arquejo] livros de verdade, de uma biblioteca. Ainda faltam alguns anos pra TV ficar popular o bastante pra ser acessível. Uma régua de cálculo e um bloco de papel não são bem um MATLAB.  As coisas de que mais tenho saudade são as pequenas conveniências. E-mail. GPS. Pizza na sua porta em trinta minutos ou menos. Coisas que não vão revolucionar sua vida, mas que podem deixar seu dia melhor. Mas não é como se os componentes dessas coisas já não existissem separadamente. Bom, os satélites de GPS ainda não estão no céu, mas... pizza existe. E, até os satélites chegarem lá, acho que posso refazer um pouco do século XX1 eu mesma.

O primeiro passo nessa direção é reaprender eletrônica. Acabei construindo uma máquina de gravação que percebi que era basicamente... bom, era só um circuito que eu podia ligar num gravador e seria essencialmente uma secretária eletrônica. Quer dizer, não tenho certeza de quando ela foi inventada, mas provavelmente existe em algum lugar. Só construí uma com os materiais a que tenho fácil acesso. Estou definitivamente alguns anos à frente da comercialização dessa tecnologia, mas consegui fazer uma pra mim e provavelmente poderia fazer mais algumas pra dar pra amigos e tal. Nada que vá redefinir meu dia de trabalho, só posso redirecionar ligações perdidas, ocasionalmente. É claro, vai ser um saco ensinar as pessoas a usar ela. Não acredito que vou ter que ensinar sobre tecnologia a pessoas nascidas nos anos vinte duas vezes.   

[rádio sintonizando; bip]

SG (na secretária eletrônica): Olá! Este é o telefone grava-mático de mensagens em voz da Dra. Sally Grissom. Não estou em casa agora, mas esse aparelho grava uma pequena mensagem que poderei ouvir mais tarde. Em alguns instantes, vou parar de falar, e vai ter um clique. Depois do clique, deixe sua mensagem.

[gravação acaba]

SG: [acelerando] Quando acabar, desligue o telefone. Vou retornar a ligação assim que puder. Sei que é complicado, e aprecio de verdade sua cooperação. Obrigada, tenha um bom dia!

[bip; rádio sintonizando]

SG: Acho minha primeira tentativa de mensagem extrovertida encheu uma bobina inteira de fita. Tem muita informação. Mas as pessoas não são idiotas, vão conseguir entender. Não posso ter mensagens de texto, mas pelo menos não vou ter que me preocupar se meu telefone está tocando quando estiver em outro lugar. Sabe como é. Com todas as pessoas que me ligam... tenho certeza de que vai ser útil, um dia desses. Vou começar a trabalhar em mensagens de texto semana que vem.

Mas isso é só uma distração. Estive evitando o trabalho um pouco. Recebi um relatório da Roberts e do Wyatt sobre uma nova experiência pra Timepiece, pra testar a viabilidade de movimentação positiva no tempo... Foi só a Roberts que desenvolveu a teoria. O relatório tem os nomes dos dois, e ela ainda não disse uma palavra sobre o assunto, mas vi eles nas mesas. Costumava ter camaradagem entre nós três. Sabe como é, contávamos piadas, sorríamos, ríamos enquanto trabalhávamos. Cantamos algumas vezes. Mas agora é só... silêncio.

A máquina funciona te puxando pra trás em direção ao Experimento Filadélfia, mas estamos procurando um modo de fazer ela viajar pra frente. Se der certo, nós poderíamos... eu poderia... eu poderia descobrir como voltar pra casa. As chances são mínimas, mas, fala sério... eu não estaria morta! Morta pro presente, pelo menos, ou como quer que isso fosse funcionar com paradoxos e o San Dimas Time e tal.

Vale a pena voltar? Pra começar, eu não estaria voltando pros 20█ que deixei, disso tenho certeza. Não tem a menor chance de cada molécula se alinhar da mesma forma e criar o mesmo mundo que deixei pra trás. Não agora. Eu não teria os mesmos relacionamentos com as mesmas pessoas mesmo nas melhores circunstâncias. Por que esperar que aqueles mesmos corpos sequer existam, o mesmo padrão de genética e circunstância pra corresponder às pessoas que eu conhecia? Não que eu tivesse muitos amigos em casa... É meio desanimador. Mas temo que Partridge e Whickman me julgariam se eu não fizesse tudo que posso pra voltar pra casa. É o que devia fazer, certo? Ir de volta ao... [suspiro] de volta ao futuro? Merda.

[rádio sintonizando; restaurante]

JW: Ótimo, porque estou praticamente faminto.

PENNY WISE (PW): Vou insistir pra capricharem nessa coxa de peru. Entre eu e você, acho eles meio mesquinhos.

JW: Fico grato.

PW: Sem problemas, docinho. Meu nome é Penny, é só chamar se precisar de algo.

JW: Com certeza- Farei isso se precisar.

PW: Espero que sim.

ER: Hm, Penny? Pode me trazer outra xícara de café?

PW: Claro, querida. Já volto.

JW: Prazer em conhecê-la...

[Penny sai]

SG: Uou, garoto, posso ouvir os fogos de artifício.

JW: Do que você está falando?

SG: Aquela coisa toda! Vamos lá, não me diga que não viu. [voz dramática] “Estou praticamente faminto!”

ER: Não estou enxergando.

SG: Ele ‘tava praticamente babando em cima dela.

JW: Eu disse para a garota que queria um sanduíche.

SG: Claro, com a sua boca. Mas eu vi nos seus olhos. Ficou totalmente caidinho por ela.

JW: Sally, essa garota é irrelevante. Estou no meu horário de almoço, e ela está no trabalho. Não é exatamente a melhor hora para um encontro com o futuro amor da minha vida.

SG: Não, é a hora perfeita! Você volta hoje à noite, pergunta a ela quando o turno dela acaba...

JW: E ela tem alguma opinião no assunto?

SG: Claro, ela ‘tá totalmente a fim de você! Mas bastante progressivo da sua parte. Ótima derrubada de estereótipos.

JW: ... Obrigado?

[Penny volta com o café]

PW: Aqui ‘tá seu café. Então, dondé que ‘ocês vieram?

ER: Novo México. Nossa companhia acabou de nos transferir para as montanhas.

PW: Foram ‘ocês que se mudaram pro velho armazém de madeira na borda da cidade?

SG: Nós mesmos.

PW: Bom, bem-vindos a Ponto de Exílio.

SG: Obrigada, Penny-hm... Qual é seu sobrenome?

PW: Wise.

SG: Bom, Wise, esse cara aqui ‘tava falando agorinha sobre como seu atendimento foi excelente hoje.

JW: Sally, o que você está fazendo—

SG: Na verdade, ele estava nos falando que, por sua causa, esse será nosso novo local de almoço na cidade.

PW: Nossa senhora...

JW: Não, eu não disse, eu estava só—

PW: Cê ‘tava só o quê?

ER: Ele estava só o quê?

JW: Nada. Eu só... aprecio... serviço de qualidade. Isso é tudo.

PW: Bom, eu... brigada. Faço o que posso. Já volto com seu sanduíche.

[Penny sai]

SG: Viu?

ER: É, definitivamente vejo agora.

JW: Não é nada! Estão colocando palavras na minha boca! Ser cupido é muito mais complicado do que só dizer a duas pessoas que gostam uma da outra!

SG: Então você gosta dela...

ER: Já viu Boêmio Encantador? Ou A Loja Da Esquina? Nesse eles não se suportavam!

SG: Oh! Mensagem Pra Você!

ER: Exatamente. Você recebe uma mensagem, e acontece de vir ela justo da pessoa que você odeia. Só precisa de uma palavra.

PW: E que palavra é essa?

ER: Uh, nada.

PW: Aqui ‘tá seu Reuben—

ER: Obrigada.

PW: E seus biscoitos com molho de salsicha—

SG: Ótimo, valeu mesmo.

PW: E uma coxa de peru, bem reforçada.

JW: Oh, uou, não sei se consigo comer isso tudo de uma vez.

PW: Bom, se precisar de uma mãozinha para terminar, eu não me importaria. Só chamar se precisar de mais alguma coisa, OK, docinho?

JW: Na verdade, tenho um pedido sim.

PW: E qual é?

JW: Você hm... Você gostaria...

PW: Sim?

JW: Seu nome é mesmo Penny Wise?

PW: [suspiro exasperado] É. Meus acharam que ia ser o máximo.

JW: Pelo menos é fácil de lembrar. Você é inesquecível... Hm, olá, Jack Wyatt.

PW: Bom, Jack Wyatt... me encontre hoje à noite e te conto tudo enquanto comemos uma torta. Fechamos lá pras nove. Até lá, Às, tenho mesas a atender.

[Penny sai]

JW: OK, agora eu vejo.

[rádio sintonizando; Sally e Anthony trabalhando na máquina]

SG: E aí o Wyatt fala [voz boba] “Não sei do que você está falando! Nem sequer gosto de garotas! ” e eu digo a ele pra calar a boca e falar com ela. Ou abrir a boca, acho— o ponto é que ele ‘tava errado.

[Timepiece liga; distorção estática]

SG: OK, checa agora.

AP: Um-vinte.

SG: Merda.

[Timepiece desliga]

SG: Então, digo a ele pra ir incomodar a garota depois do trabalho, e nem precisava, ela voltou com nossa comida com o flerte ligado no máximo. A garot–- e o nome dela era Penny Wise, sabe? Pennywise? Juro por Deus, era o nome verdadeiro dela—

AP: Sally, o que estamos fazendo aqui?

SG: Como assim? Aqui e agora? Ou existencialmente?

AP: No meio do nada. Acho que preciso recalibrar meus vários compassos internos.

SG: Bom, nossos processos corporais naturais estão bombeando sangue rico em oxigênio para os nossos tecidos, enquanto sinais eletroquímicos nos nossos cérebros estimulam a complexa, mas conveniente ilusão de consciência e controlam o corpo: mãos, braços, pés, pernas. Suas cordas vocais estão vibrando para empurrar o ar através da sua boca, moldado pelos seus dentes e língua, para ser interpretado pelo meu cérebro como linguagem.

AP: ... De forma mais geral.

SG: Estamos usando ferramentas pra fazer o nosso trabalho.

AP: Sally! Pare de dar uma de sabichona.

SG: Estamos fazendo a verificação de falhas dos circuitos principais da Matriz Inibidora de Higgs Aplicada, codinome TIMEPIECE, em preparação para uma rodada de testes. 

[Timepiece liga, distorção estática]

SG: E agora?

AP: Um-vinte e três.

SG: Merda.

[Timepiece desliga]

AP: E por que estamos fazendo isso?

SG: Porque trabalhamos pra uma divisão supersecreta do serviço de inteligência dos Estados Unidos da América, e queremos nos assegurar de que está à altura.

AP: E por que estamos fazendo isso para eles?

SG: Porque são incrivelmente poderosos, porque nos pagam, porque Donovan fez um discurso motivacional, e porque é a única oportunidade de trabalhar com ciência literalmente décadas a frente de seu tempo. Pode escolher.

AP: E por que eles querem isso?

SG: “Eles” são uma pessoa, objeto ou mineral? Qual é a das Vinte Perguntas?

AP: Estou curioso. Por que eles, por que Donovan, querem a Timepiece?

SG: Vai chegar ao ponto?

AP: Como chegamos aqui?

SG: Ah, fala sério, você não–

AP: Não, quer dizer, de Polvo a Ponto de Exílio.

SG: Viemos de van.

AP: Não! Quer dizer... antes de chegar aqui, eu estava gerindo meia-dúzia de projetos inovadores. Depois, você se se tornou um pé no saco diário—

SG: E, espero, uma amiga e colega de confiança.

AP: Isso também. E aí as coisas começaram a sair do controle. A Timepiece foi ativada, houve uma viagem para Las Vegas, e aí o acidente de Quentin, e aparentemente você fez um trabalho incrível na noite de Natal. Perdi a maior parte daquele dia, mas Jack me contou que estava em três lugares ao mesmo tempo.

SG: Ha. Bom, aquela noite foi bem confusa pra mim também.

[Timepiece liga; distorção estática]

SG: Tenta agora.

AP: Meu ponto é, não posso evitar fazer os cálculos e concluir que a Timepiece não trouxe nada a não ser problemas a ninguém.

SG: Isso provavelmente é verdade.

AP: Então por que Donovan continua acreditando no projeto? Em nós?

SG: Pra falar a verdade, não sei. Sei o que pode acontecer, as coisas incríveis que podemos fazer se conseguirmos desenvolver um sistema efetivo pra essa coisa... mas você tem razão. Falhamos demais. Mais do que acertamos, na verdade.

AP: Então pergunto de novo: O que estamos fazendo aqui?

SG: ... Quero ver essa máquina funcionando. Quero ver ela ajudar alguém.

AP: Não era esse o problema? Não dá para vê-la funcionando? Ou funcionou, ou não, e não dá para saber, ou algo do tipo?

SG: Se desse pra ver o que mudou... Se desse... Ugh. Não sei. Quem sabe o que acontece quando você muda algo pequeno... O que o medidor está dizendo?

AP: Um-vinte e sete.

SG: Perfeito! OK. Vamos botar essa mocinha pra trabalhar.

AP: Bom, dois anos atrás eu era basicamente seu chefe, e agora você é definitivamente minha chefe.

SG: Escuta, Partridge. Não sou sua chefe. De todas as pessoas aqui que poderiam ser suas chefes, sou a que menos é. Partridge, a Timepiece precisa de você. Essa equipe precisa de você. Eu preciso de você. Mas não como um subordinado. Preciso de alguém que olhe pra frente enquanto eu olho pra trás. O milagre da Timepiece não é só nos levar pra trás, é a possibilidade de usar ela pra mudar como vamos pra frente. E é o único que pode nos ajudar com isso. Sem você, a Timepiece fica empacada. Pronto?

AP: Pronto.

[empurrando alavancas; Timepiece acelerando]

AP: Sally... se a Timepiece conseguir fazer o que estamos tentando, acha que voltaria para o futuro?

SG: Não sei. Mas gostaria de ter a opção.

[Timepiece ativa; rádio sintonizando]

SG: Diário de Sally Grissom, 1 de Março de 1946. Te poupando dos detalhes entediantes, a hipótese não foi comprovada no teste com a Timepiece. Sabemos agora, sem uma sombra de dúvida, que avançar no tempo usando os princípios dela é efetivamente impossível. Quer dizer, avançar no tempo sempre foi possível, só... na velocidade de um segundo por segundo. Sei que da última vez que gravei aqui fiz altas conjecturas sobre não querer voltar pra 20█, mas, agora que sei que não posso, bom... dói. Quer dizer, já era um tiro no escuro desde o começo, mas agora que temos números sustentando tudo, não consigo evitar me sentir como uma criança petulante que quer o que não pode ter. A grama é sempre mais verde, sabe?

Os resultados não são de todo ruins. Pudemos dar uma olhada melhor da resposta taquiônica dos fótons que é gerada pelo uso da Timepiece. Se modulada errado, causaria algo como o pulso eletromagnético que vi nos meus primeiros meses com a ADRA. Mas, com alguns ajustes, parece que dá pra ajustar a frequência do pulso, tipo uma “assinatura” atribuída a uma ativação específica da Timepiece. É claro, ela só existe realmente no ponto de origem e daí viaja pra trás no tempo em direção ao Eldridge. Então, minhas desculpas vão pra tripulação do Eldridge em outubro de 1943, que passou sua viagem sendo bombardeada por uma quantidade sempre crescente de táquions. Mas, se tivesse algo lá pra receber eles, provavelmente daria acompanhar todas as viagens feitas com a Timepiece. O ponto âncora teria que ser mudado pra uma estação de escuta diferente, ou algo programado pra receber as respostas do futuro quando o Arco-íris for ativado; é capaz de ser possível até montar um sistema pra localizar eles. Não poderia não ser conveniente, sabe? O que você faria se pudesse mapear os deslocamentos das areias do tempo?

[rádio sintonizando; distorção estática]

BD: Vou assumir que está subentendido que pode não espalhar essas informações além desta... sala. Não pode espalhar isso para fora desta sala.

AP: Mas as pessoas precisam saber! Tem certeza que é por causa do que... você fez... com a Timepiece?

CW: Se estava lá antes, a Timepiece acelerou o processou. A conjugação dele está uma bagunça.

BD: [tosse] Você merece todos os agradecimentos, Chet. Eu poderei... Consigo falar sozinho. Só me deem um minuto.

AP: Por que não contou isso para Sally?

BD: Sally estava volátil. Estamos mantendo isso o mais secreto possível.

CW: Por favor, você tem que ajudá-lo. Entende que tudo foi pelo bem da ADRA, pelo bem de todos nós. E agora ele está morrendo.

AP: O que quer que eu faça?

BD: Eu precisava que conseguisse a resposta certa. Curar o que há de errado com o meu raciocínio.

CW: Você é a única pessoa a quem podemos recorrer.

AP: Diretor... Bill. Eu farei tudo que puder para lhe salvar. Irei até o fim, mas você precisa abrir o jogo com a equipe. Pelo menos conte à Sally. Ela merece saber sobre o que você fez.

BD: Já falamos disso. Mas só onde você encontra a resposta certa. Quando chegar não fale a ninguém. Inaceitável.

[Bill tosse; distorção estática se intensifica]

CW: Anthony... ajude-o. Por favor.

[gravador de fita desliga]


ars PARADOXICA é criado por Daniel Manning e Mischa Stanton.
Episódio 06: Exílio
características -

Kristen DiMercurio (Sally Grissom)
Reyn Beeler (Chet Whickman)
Rob Slotnick (Bill Donovan)
Robin Gabrielli (Anthony Partridge)
Susanna Kavee (Helen Partridge)
Katie Speed (Esther Roberts)
Zach Ehrlich (Jack Wyatt)
Charlotte Mary Wen (Penny Wise)
com agradecimentos especiais a Isabel Atkinson

Música original de Mischa Stanton.

20 18 01 01 24 04 07 09 22 | 10 23 25 17 03 14 09 08
WEATHER: foggy